Ele não faz parte de um reality show, mas é uma celebridade. Aos 56 anos, o americano Jeff Koons é um ícone da arte contemporânea e ostenta um dos maiores faturamentos da área. Uma de suas obras, parte da série Celebration, foi vendida em 2008 a 26 milhões de dólares. Apesar do bom desempenho comercial, Koons rejeita a ideia de ser um novo Salvador Dalí e defende que a arte deve educar as pessoas. Em São Paulo para prestigiar a abertura da exposição Em Nome dos Artistas, em comemoração dos 60 anos da Bienal, o artista falou ao site de VEJA sobre o que acredita ser a sua função, sobre sua relação com celebridades como Michael Jackson, que transformou em escultura, e sobre o casamento com a atriz pornô italiana Cicciolina. Abaixo, continuação da entrevista de Jeff Koons iniciada aqui.
O fato de você não se ater à distribuição do trabalho torna ações de marketing cruciais ao funcionamento do seu estúdio? Quando eu era mais jovem, gostava de ler livros de Nicolau Maquiavel, o que me deu a consciência de não cair na tentação de me destruir publicamente. Salvador Dalí foi um grande artista, mas desperdiçou muita energia num determinado período de sua carreira quando se envolveu com a distribuição de sua obra e se dedicou a fazer cópias e cópias de um mesmo trabalho.
É a sua aversão à reprodução que faz com que suas obras atinjam grandes preços em leilões? Num certo grau, sim, mas prefiro acreditar que a pessoa tenha gostado realmente da obra para pagar um preço tão alto por ela. Prefiro acreditar que a pessoa tenha visto na obra algo útil para a sociedade e que, por isso, merece ser preservada. Nos tempos atuais, cria-se um valor agregado exagerado para certas coisas. Hoje, admiramos apenas cópias de obras criadas há séculos.
Como você reage aos críticos que o consideram mais um comerciante das artes do que um artista propriamente dito? Quando eu era jovem, trabalhei como corretor da Bolsa de Valores em Wall Street. Por causa disso, as pessoas acham que a única motivação na minha vida é ganhar dinheiro, o que não é verdade. O discurso é mais importante do que a crítica.
De que maneira a instabilidade econômica mundial afeta o mercado de arte contemporânea? A instabilidade não é ruim para o mercado de arte. Depois da crise de 2008, o mercado ficou fortalecido. As pessoas veem na arte uma fonte segura de investimento quando as coisas parecem confusas.
De uma forma geral, você acredita que a arte hoje é influenciada atualmente pelo culto à celebridade? Sim, tudo é influenciado pelo culto à celebridade hoje. No meu caso, eu primeiro busco meus sentimentos e depois quero dividi-los com os outros. No fim das contas, procuramos a nós mesmos através dessas performances artísticas e elas nos ajudam a entrar em contato com os nossos talentos.
Sobre a escultura de Michael Jackson: ele posou para você? Não, me foram enviadas muitas fotos de seu acervo pessoal e, algum tempo depois, recebi uma ligação de seu escritório dizendo que ele queria ver como estava o trabalho -- ele não sabia que a escultura estava sendo produzida na Europa. Nesse mesmo dia, ele cancelou a visita devido a uma dor de garganta. Eu tentei encontrá-lo outras três vezes, depois desisti.
Por que escolheu Michael Jackson para retratar numa escultura? Em 1988, quando finalizei a escultura, Michael Jackson estava no auge da carreira. Quis fazer referência a algo como a Pietá de Michelangelo. A escultura de Michael Jackson, inclusive, tem o mesmo formato triangular da Pietá.
Você quis dizer, então, que Michael Jackson é visto como um deus em nossa sociedade? Como uma figura espiritual. Eu queria retratar algo que fizesse as pessoas se sentirem seguras consigo mesmas, que as ajudasse a superar seus medos. A escultura de Michael Jackson representa a cultura de adulação dos ídolos pop em nossa sociedade.
Uma das suas obras expostas na Bienal é a série Made in Heaven. Que tipo de reação você queria despertar no público quando a concebeu? Quando criei Made in Haven, estava muito conectado a essa filosofia de completa aceitação de mim mesmo e do meu entorno. Conheci a minha ex-mulher (a ex-atriz pornô Cicciolina, com quem Koons posou em fotos eróticas para a série Made in Heaven) quando fui convidado pelo Whitney Museum of American Art a participar de uma exposição chamada Image World, sobre o mundo midiático. Neste momento, estava conectado com a intenção de remover sentimentos de culpa e vergonha da vida das pessoas. Desculpe se eu não me prolongar nesse assunto, é doloroso.
Pode explicar o motivo? Eu e minha ex-mulher tivemos um filho. Após a separação, ela o levou para a Itália e eu nunca pude criá-lo. Ele está com 18 anos e espero que compreenda tudo o que aconteceu. Minha série Celebration foi uma tentativa de me comunicar com Ludwig à distância e de lhe dizer que nunca o esqueci.
É verdade que você teve um filho enquanto estava no colégio e o deu para adoção? Quando estava no colégio, minha namorada engravidou. Tínhamos 20 anos na época e, quando Shannon nasceu, ela foi levada para adoção. Isso tudo foi muito difícil para mim. O maravilhoso é que a família adotiva de Shannon a criou muito perto de onde eu vivi. Quando ela cresceu, me encontrou. Shannon apareceu na minha vida na mesma época em que tive essa grande perda de Ludwig. Mas prefiro não me prolongar nesse assunto.
Você concorda em ser visto como um dos ícones do pós-modernismo? Eu sempre quis participar da tradição vanguardista das artes, mas nunca fiz parte de qualquer diálogo construído em torno da manifestação de uma plataforma pós-modernista.
O que seu trabalho traz para a sua vida atualmente? É a expressão de alguém que luta contra as suas limitações.
E o que faz para superar essas limitações? Basicamente, conquistar autoconfiança. Eu trabalho com infláveis, porque é um material que permite expandir os parâmetros. Acredito que qualquer coisa pode ser ampliada, inclusive a relação de cada um consigo mesmo.
Em que está trabalhando neste momento? Estou criando uma série chamada Antiquity, formada por telas e esculturas. Na série Celebration, que comecei em 1994, fiz uma obra chamada Diamonds, que representa o momento da concepção. Isso descreve a única narrativa verdadeira da história humana, que é a biológica. Então, a série Antiquity é um desdobramento disso. A série começa no tempo atual e se volta ao passado para dialogar com artistas como Dalí, Manet e Bernini.
http://veja.abril.com.br/noticia/celebridades/jeff-koons-entrevista
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